quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

mantendo-se onde a luz está

Relendo alguns posts, peguei-me decepcionada comigo mesma. Decepcionada por às vezes tentar colocar os fatos que acontecem em palavras tão claras e objetivas sobre o que faço, o que penso, o que quero. Sei lá, talvez seja essa parte bem objetiva de mim que, às vezes, falta no meu cotidiano, mas que é bem presente quando eu sento pra escrever sobre minha própria vida. Isso existe em mim desde que eu aprendi a escrever: minha mão doía por conta das horas que eu me punha a escrever no meus diários, quando era criança, porque teimava em escrever tudo que tinha acontecido no meu dia, não importasse quantas páginas seriam usadas ou quanto tempo eu teria que dedicar àquilo. Mas a verdade é que acho que faltou muito, na maioria dos posts, a expressão do meu amor por Mostar, do meu amor pelo UWC e pela oportunidade de vida que eu tenho.
Aqui em casa, às vezes, quando eu sento em algum lugar e tenho uns flashes em curtíssimos intervalos de tempo que trazem à tona emoções (algo que Stanislavski chamaria de "emotion memory") que já tive algum dia. Muitas delas vêm do período de tempo que passei sem saber o que aconteceria com meu futuro (começinho do ano) e depois, de quando me despedia daqui e me entregava pro mistério do meu novo caminho. Sinto a agonia que tinha e o medo meio-não-sei-de-quê. E aí veio o UWC, todo aquele novo mundo diante de mim.
E eu tinha 16 anos e achava que sabia tanto da vida - e talvez soubesse muito mais do que a maior parte das pessoas da minha idade ao redor de mim, que não tinham passado por nem metade do que eu tinha - e achava que aquela vida nova nem ia ser um "baque" tão grande assim. E nem achei que foi até voltar pra cá e ver que não tolerava mais coisa que antes deixava passar, que tinha coisa que me revoltava tanto e coisa que eu nem ligava mais - tão irrelevantes...
Caí num "mini mundo com problemas de mundo" sobre o qual eu achei que já sabia muito. E fui desiludida. E fui encantada. E me apaixonei por algo que não é descritível nem pode ser reduzido à palavra "mundo". Que mundo vasto e grande! E cruel! E fascinante! Tanto a aprender, a ver, a sonhar, a ensinar e a amar.
Voltei com meu criticismo de sempre, mas muito mais apurado e agora tomando tanto cuidado com as palavras, com a reação que elas podem provocar. Palavras são armas de paz e armas de guerra. Ouvindo com tanta atenção, tentando pegar o sentido de cada palavra com os dedos da minha mão.
Não há nada que eu não associe com a minha vida em Mostar; não houve nenhum momento aqui ainda em que eu esquecesse as pessoas, a atmosfera, o amor, a liberdade: coisas tão fortes pra se nomear que ficam fortemente nomeadas. Fora as infinitas e infindáveis perguntas sobre meu aprendizado, sobre minha vida lá, eu ainda me pego com a minha emotion memory, com sorrisos brotados no meu rosto por piadas realmente internas que soam em minha cabeça ao longo de respostas longas que parecem - e já são - ensaiadas.
Esse break não é fácil. Não é fácil me dar conta de que aquela vida não é eterna e nem sequer o fim. Ainda tem tanto, tanto por vir na vida. E, Ai!, como eu tenho medo do que virá por não saber o que é. Saber que meus próximos um ano e meio estão razoavelmente planejados e aí um abismo...!
Mas sem viajar tanto sobre o futuro e voltando a me dar um pouco de conta sobre o presente... Kelly, minha segundo ano que estuda no Red Cross Nordic UWC, me disse que provavelmente o segundo term dela teria sido muito diferente se ela tivesse voltado pra casa no Winter Break, que ela não teria sofrido tanto tendo ilusões sobre as maravilhas do Brasil e tendo saudade tão enorme de casa... E Bebo me disse a mesma coisa numa noite em que conversamos e tomávamos aqueles isotônicos de limão que sempre me deixam absurdamente enjoada sentados no muro do lado do mercado de Musala.
Voltar pra casa..., bom, não sei. Não é fácil. A liberdade é limitada, a quantidade de pessoas ao seu redor é limitada, a mobilidade pelo espaço é limitada, o transporte é limitado. Esse é um momento e lugar em que me sinto tão desamada e tão amada ao mesmo tempo que parece que algo em mim vai explodir. Família: amor, união, responsabilidade, mas dependência. Tantas definições confusas na minha cabeça e não sei se já está na hora de voltar pra Mostar. Quero muito, na verdade, mas sinto que não fiz tudo que deveria aqui ainda - e sei que nunca vou sentir que fiz. Nunca vou conseguir ver todos que eu gostaria e visitar todos os lugares que eu amo nesta cidade. Converso com muitos co-anos e segundos anos que me dizem não se imaginar em outro lugar agora que não em casa. Ai se me perguntassem... ah! a quantidade de lugares que eu poderia nomear nos quais poderia me imaginar agora...!
Muita gente interpreta errado, acha que não gosto daqui. Nunca fui muito caseira, é verdade. Mas amo, amo aqui e não vai ser fácil deixar o aqui outra vez; reforçar mais uma vez a decisão que eu tomei; deixar aqui pessoas que precisam de mim. Por mais cinco meses.

"dirigindo para longe. sozinha. no escuro."

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